domingo, 26 de fevereiro de 2012

Eu componho às 3:00

Me dei conta que nossas vidas ficaram pra traz, e agente vai se esgotando como as canetas que acariciam os diários, vai se desfazendo nos flashs que criam nossas fotos, e volta a caminhar no hoje. Desarmado, despreparado, desprevenido, descrente, sem poder contar com o que já ficou tão longe, ainda fingindo que ela esta perto, pra não reconhecer que muito de você já morreu.
Ai o dia nasce de novo, e eu torno a produzir mais passado pra dizer que eu vivi. Tentando construir o hoje que perece rápido de mais, tentando inventar futuro, que tão breve, irá perecer também.
E as pessoas vão embora, e você manda outras, e ficam os buracos, e aparecem as pás, e os que foram são enterrados, e com eles vão pra terra outro pedaço de nós, e agente julga ser capaz de se recompor de uma maneira melhor, e ao acordar no outro dia não se recorda de ter sido diferente, e o hoje vira o inimigo outra vez, e não há pra onde fugir.
E as 7:00 você se nota
As 10:00 você se esvai como tinta de caneta
As 14:00 você se desintegra como flash
As 18:00 você torna a perecer
As 20:00 surgem as pás
As 3:17 você se escreve, e faz do passado síntese em poucas palavras, em poucas lembranças, e você dorme, porque ao acordar você precisa produzir mais, e mais, pra provar que viveu, e prova na medida que produz. E finge ter vida na proporção que tem lembranças. Dos que partiram, do que partiu.
E os álbuns estão cheios do eu que não sou mais,
desse póstumo eu que lamentava um outro antepassado,
que lamentava a existências de outras pás,
e todos eles odiavam não poder tirar lá do fundo,
o que morreu com o ontem,
sucumbiu ao hoje
e se perdeu no amanhã.

25 horas

Espalhei tarrachas afiadas por entre as teclas da máquina de compor súplicas, e com as pontas dos dedos eu as cato junto ao sofrimento. Tento calar meu clamor, suprimílo com gritos, como se meu auto flagelo composse uma sonata derradeira dentre versos que me recuso a escrever.
E me ferir parece funcionar, e vejo que não ha sentido nas frases, só teclas, e teclas, pressionadas, enquanto o ferro dourado, de cada pedaço de dor, entra em meus dedos, e os pedaços de mim começam a se juntar e a formar o que resta de nada. 
E de repente eu noto que não tento desenhar o que meu espirito sente, nem mesmo colorir as marcas que me fizeram, tão pouco escrever o que eu acredito sentir. Somente faço de casa os dedos que ainda não foram coloridos, e abrigo os pedaços gelados de lanças que compõem o meu drama teatral . E no "p" firo meu anular direito, e no "q" firo meu anular esquerdo, e no cansaço, no fracasso, no desespero, bato a cabeça "gbbnavncr,tfcna" e meus olhos sangram.
E então eu releio, meses depois, num dia onde desesperadamente procurei uma frase nova, e acabei me encontrando num texto velho. Sem sangue nas mãos, sem lágrimas nos olhos.
Eu me releio, com um certo desdém, e torno a lamentar não ter encontrado nenhuma frase nova.
No dia em que eu tive 25 horas pra tentar.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

...

Sinto-me perdido neste mar morto, que chamo de minha vida até então,
e ilhado em tuas margens fictícias...

Cansado de nadar inútilmente em busca de terra firme, tento me afogar nessa falsa sensação de assentir.

Torno piloto de mim mesmo (só por alguns segundos), destruo os botes salva-vidas, amarro-me, com a âncora, em tudo aquilo que fingi ter vivido, e afundo com o navio...


- Até quando continuarás a espanar oceanos?
As ondas truculentas não se melancolizarão por tua causa...
Os tripulantes já estão fugindo que todo jeito-maneira - eles não querem ver a tua autodestruição..
Não vês que todos já estão sofrendo normalmente...